Oito de Março é, historicamente, o dia das mulheres reivindicarem a igualdade de género com manifestos por esse mundo fora, lembrando assim, que em pleno século XXI há muita maratona para correr até ao cortar da meta – leia-se direitos, deveres, e oportunidades, iguais para homens e mulheres.
Já no distante século V a.C., Sócrates e o seu discípulo Platão repudiavam a visão machista reinante na sociedade Ateniense. Lá, a mulher “valia como meio homem”. Discordante, Sócrates (que teve duas mestras) atribuía-lhes antes um “intelecto de valor”, posicionando a equiparação homem/mulher ao nível dos Direitos Humanos.
Mais de dois milénios volvidos a maior intervenção social feminina, “na política, na medicina e até nas milícias” –, que estes filósofos já preconizavam - é um dado adquirido, mas a verdadeira igualdade de oportunidades está ainda por concretizar. No mundo do trabalho, males antigos persistem: as diferenças salariais para idênticas funções às dos homens, a maior dificuldade em alcançar cargos de topo, as provas suplementares que têm de prestar em setores conotados com o sexo masculino, a discriminação por poderem gerar vidas, são apenas alguns.
A desbravar este caminho andam três parceiras do Habitissimo. Mulheres que fizeram da construção e remodelações a sua profissão e que explicam como se impuseram nestas áreas tipicamente masculinas, ante homens que as olharam de lado. Com competência, resultados e resiliência, três histórias inspiradoras: Susana Bernardo de Carvalho (My Project), Filipa Ribeiro (Duality Remodelações) e Thais Martins (Personalize Remodelações).
Neste artigo
- Susana Bernardo Carvalho – My Project
- Filipa Ribeiro - Duality Remodelações
- Thais Martins - Personalize Remodelações
- 8 de Março tem de ser todos os dias
Susana Bernardo Carvalho – My Project
Há quase duas décadas que trata por tu remodelações e direção de obra. Um par de áreas com vasto histórico associado a profissionais no masculino. Nada que demovesse a arquiteta de Lisboa, que está a morar em Faro há 4 anos, Susana Bernardo Carvalho. Às dificuldades próprias da profissão, somou, por isso, os desafios que se colocam às mulheres que entram numa profissão predominantemente masculina.
Foi-os superando, a um e um. Hoje na área da construção civil já “não somos tão olhadas de lado, com ar reprovador dos trabalhadores/empreiteiros”, afirma. O maior desafio em obra, sublinha, surge “quando sou confrontada com a maneira como se executa o trabalho”. Aí, “questionam e esperam a resposta, e caso falhasse, e não fosse a correta, aí sim, gerava um problema, pois era sinal que não sabia o que andava ali a fazer e era descredibilizada”, explica. Ou seja, o maior antídoto para as resistentes mentes ‘atenienses’ é resolver in loco (na obra) os problemas que surjam. E, assim, “gerar confiança”. “Os pensamentos machistas são, automaticamente, colocados de lado”, remata a arquiteta.
Naturalmente, “os anos de experiência em obra” contribuem muitíssimo para a postura que tem hoje. Mas é a soma de bons resultados que silenciam os reticentes em ser uma mulher a gizar e dirigir uma obra.
Na génese da sua empresa - a My Project - esteve um “bichinho” que Susana sempre teve dentro de si: o interesse pela patologia da edificação. É que, tal como nós, explica a arquiteta, “os edifícios também adoecem e é preciso tratá-los”, como os médicos tratam dos seus doentes.
A empresa focou-se neste nicho de mercado, reabilitando/renovando edifícios ou - naqueles cujo estado de degradação não o permite de todo-, construindo de novo.
“Entrar num espaço degradado, e dar-lhe a vida que perdeu, é uma satisfação enorme, uma sensação de objetivo cumprido”, partilha a profissional, aproveitando para deixar um conselho aos leitores que querem melhorar as suas casas. Permanece em Portugal a ideia de que “os arquitetos saem caros”, nota Susana, um preconceito sem adesão à realidade. “Sem a nossa ajuda/apoio, o que geralmente acontece, é que as obras derrapam e os valores são ultrapassados, a nossa mais valia é fazer uma triagem das necessidades do cliente e apresentamos diversas soluções que existem no mercado”. Desta forma, minimizam custos ao longo da cadeia. Mais do que apenas projetar para construir de raiz, a profissional intervém em todas as fases: desde a compra do imóvel, passando pela sua remodelação, até à sua entrega com chave na mão.
Às jovens que pensam dedicar-se a esta área, deixa a máxima que sempre a guiou: “Não tenham receio de abraçar os vossos objetivos e pretensões, tomem decisões racionais, sigam o vosso trajeto e coloquem de lado as dificuldades do dia-a-dia que acarreta esta nossa profissão.”
Para saber mais, aceda o perfil da empresa!
Remodelação de casa banho realizada pela My project.
Filipa Ribeiro - Duality Remodelações
Um pai deixa sempre muito mais do que uma herança genética, e o pai de Filipa Ribeiro foi uma espécie de farol naquela que viria a ser uma escolha de vida: a sua profissão.
Empresário na área da construção, fazia-se acompanhar pela filha, que começou por apoiá-lo no backoffice. Seguindo e observando os passos do pai, Filipa foi exponenciando as suas responsabilidades. E, há cerca de dois anos, focou-se a 100% na atividade da empresa familiar - que nasceu tendo como core business a área das canalizações.
À obra do pai, Filipa adicionou mais uma área de negócio. Tudo começou como um “desafio pessoal”. Começou a remodelar casas de banho de clientes, sempre fazendo questão de criar “projetos personalizados para cada um”. Correu bem, e “com o tempo, e a paixão que tinha pelas obras, e por todo o processo construtivo”, foi somando projetos. O desafio redundou num “enorme sucesso”, conta satisfeita. A tal ponto que criou a Duality Remodelações, vocacionada para remodelações e decoração.
Ao longo desta expansão, Filipa não nega que mesmo tendo crescido dentro do setor teve exigências acrescidas só pelo fato de ser mulher. “Nesta área, as mulheres enfrentam muitos desafios, a grande maioria das pessoas acredita que só os homens percebem de obras e, muitas das vezes, desvalorizam as opiniões femininas”, lamenta, concluindo que: “Cabe a nós, mulheres, assumir uma postura confiante e assertiva, e não valorizar opiniões negativas.” Além disso, releva a “paixão” pela atividade e a postura “humilde” como requisitos para construir e consolidar uma carreira neste setor. “Esta é uma área em que temos de saber estar, e falar, com muitas pessoas, muitas personalidades diferentes, muitas visões e opiniões; e é importantíssimo manter uma postura exemplar, respeitar toda a gente”, disseca a empresária.
Aos leitores que planeiam melhorar a sua casa, recomenda: ”É muito importante escolherem uma empresa qualificada e certificada. Por vezes, os orçamentos mais baratos não são aquilo que as pessoas esperam”. Daí ser avisado os clientes pedirem, e verificarem referências da empresa antes da adjudicação da obra. A par disto, aconselha: “Devem ter sempre uma pessoa que os acompanhe desde a orçamentação até ao fecho de obra”.
Para saber mais, aceda o perfil da Duality Remodelações!
Um grande exemplo de um antes e depois de uma casa de banho de serviço.
Thais Martins - Personalize Remodelações
Na linha do tempo, há que recuar ao efeito das ondas de choque que a crise do subprime teve no setor da construção civil para assinalar a entrada profissional de Thais Martins no mundo das remodelações e construção. Em bom rigor, o percurso de vida da empresária brasileira já lhe tinha despertado o gosto por esta área. O pai marcaria de forma inapagável esta escolha: “O meu pai, empreiteiro, disse sempre que os acabamentos davam muitas dores de cabeça, levavam muito tempo, o cliente tinha sempre pressa e os funcionários não tinham brio e zelo como deveriam”. Nas obras da primeira casa que Thais comprou, há 15 anos, foi ela mesma que pôs a mão na massa e os acabamentos ficaram por sua conta. Também a trabalhar com o pai, começou a executar algumas fases dos acabamentos e a liderar outras. “Correu tão bem que mudei de profissão”, recorda.
Mas, se o gosto pelo ofício nasceu depressa, o know how foi sendo adquirido ao longo dos anos. “Aprendi imenso e abri (em 2012), em Porto Seguro, no Brasil, a Personalize Remodelações”. Empresa que traria na bagagem quando de regresso a Portugal encontra um “mercado (o da construção) ainda a recuperar-se da crise”.
Como tantas mulheres, lutou para compatibilizar profissão (neste contexto exigente) e a presença na vida dos filhos. É nesta busca de conciliação que o “sonho pessoal” vai ganhando asas. Começa a trabalhar com um empreiteiro de Lisboa, que a ajudou a pôr em prática aquela que, diz, é a marca d’água do seu trabalho: “Fazer acabamentos como se fossem para a minha casa, com zelo e capricho”.
Trabalho que é diretamente proporcional ao divertimento, sobretudo desde que a amiga Alda Manuela aceitou o desfio de se juntar à equipa. “Nos divertimos a fazer o que gostamos”, diz com entusiasmo. E nem ‘as bocas’ que ainda ouvem dos homens quebram esta satisfação. Thais não tem dúvida de que o preconceito masculino persiste. “O esforço físico devia ser o principal desafio mas, infelizmente, o preconceito ainda é o pior”, lamenta, rematando que: “Ou estranham ver duas mulheres entre os homens a executar os trabalhos, ou mandam piropos deprimentes”.
Visões bolorentas à parte, Thais está realizada na profissão. “Em casa trabalhamos mas, nem os filhos, nem o marido, pagam por nada”, diz com humor. “Na obra fazemos o que gostamos, deixamos famílias felizes e, além de pagarem, dizem obrigada!”
É no mesmo espírito prático que a fundadora da Personalize Remodelações partilha com os leitores um pequeno truque, que costuma usar: “Depois de limpar, e secar, o lava-loiça de inox, passem toda a cuba com uma esponja de lixa fina para metais, em movimentos contínuos (de ir e vir) até saírem os riscos antigos. Passem, depois, um pano de microfibra para tirar o pó, e o resultado é uma cuba novinha sem manchas, nem riscos”. Simples e eficaz.
Para saber mais, aceda o perfil da Personalize Remodelações!
Projeto de cozinha rústica.
8 de Março tem de ser todos os dias
Oficializado pela Organização das Nações Unidas em 1975, o Dia Internacional da Mulher é comemorado desde o início do século XX, tendo, na sua origem, a luta de trabalhadoras fabris nos Estados Unidos, por melhores condições de trabalho e salários - reivindicação que acabou por se alastrar a vários países europeus. Quatro décadas e meia depois, as mulheres conquistaram direitos civis e políticos mas o 8 de Março está aí para forçar outro salto civilizacional necessário: a equiparação efetiva entre homem e mulher, uma questão de direitos humanos como, sabiamente, já defendia Sócrates.